No Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa foram lançados, no Rio de Janeiro, um Guia de Luta Contra a Intolerância Religiosa e o Racismo, junto com o DVD da Primeira Caminhada em Defesa da Liberdade Religiosa, ocorrida em setembro de 2008. O encontro, que reuniu representantes de 18 entidades não governamentais, autoridades, artistas, lideranças de diversas tradições religiosas e representantes da polícia civil, iniciou com um minuto de silêncio em memória aos nove mortos no desabamento do teto da Igreja Renascer, em São Paulo.
Durante a cerimônia, a Comissão Nacional de Combate a Intolerância Religiosa fez uma homenagem especial à polícia civil, devida à contribuição do coronel da reserva da Polícia Militar e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Jorge da Silva, na construção da cartilha. O guia, que será distribuído a todas as unidades da Polícia Civil, vai ajudar os policiais no registro das queixas que chegam às delegacias.
“Além dos policiais não saberem qualificar as ocorrências, é uma tendência histórica por parte das policiais no Brasil de minimizar os casos de intolerância religiosa”, explicou Jorge da Silva. A idéia é que, através do guia, seja traçado projetos e ações de sensibilização dos agentes na compreensão da diversidade religiosa.
O guia é baseado no cumprimento constitucional da lei nº 7.716/89, conhecida como Lei Caó, com especial atenção ao artigo 20, que prevê penalidade de até cinco anos para crimes de racismo e intolerância religiosa. Nela as vítimas da intolerância religiosa e racial poderão encontrar orientação de como proceder nos casos de crime e endereços de auxílio.
De acordo com Ivanir dos Santos, da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, o material deve material sirva para desmantelar o preconceito ainda existente na sociedade e promova o diálogo entre membros religiosos ou não: "Só vamos conseguir avançar contra o preconceito religioso, quando entendermos que o que está em risco é a democracia”.
O encontro, mediado pelo deputado estadual Ivanir dos Santos e presidente da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, contou com a presença do Reverendo Marcos Amaral, da Igreja Presbiteriana de Jacarepaguá, do ministro interino da Igualdade Racial, Eloy Ferreira, do padre Fábio Luiz, da Comissão de Ecumenismo e Liberdade Religiosa da Arquidiocese do Rio de Janeiro, e Sérgio Niskier, presidente da Federação Israelita do Rio de Janeiro.
Em seguida, foram realizados debates com vítimas que sofrem preconceito religioso. Entre elas, o caso de Cosme de Oxoce, que sofreu discriminação no dia 12 de janeiro, no bairro de Paciência, na Zona Oeste do Rio, enquanto fazia uma oferenda. “Eu estava arriando uma obrigação, quando fui xingado e desrespeitado por um pastor que passava pelo local, acusando-me de ser um servidor do diabo. Além de discutirmos, ele quebrou minha oferenda e tentou me agredir fisicamente”, contou o rapaz.
De acordo com Carlos Nicodemus, coordenador-executivo do Projeto Legal, que atende vítimas deste tipo de discriminação, foram registrados 15 casos de intolerância religiosa no ano passado e apenas uma pessoa foi condenada. “Cerca de 70% dos casos são contra seguidores de religiões de matriz africanas”.
Uma das propostas sugeridas pelo ministro Eloy é a criação de delegacias especializadas para cuidar de casos como esse. “Só o encarceramento não resolve. É preciso mudar os valores”, disse.
Na parte da tarde, o debate seguiu com uma mesa composta por intelectuais especializados no tema. Entre eles, estavam presentes o Luiz Paulo Horta, imortal da Academia Brasileira de Letra Rio de Janeiro; Muniz Sodré, doutor em Comunicação e professor - titular da ECO/UFRJ; Carlos Vereza, ator e documentarista; Azuenilda Trindade, coordenadora de comunicação; entre outros.
Para Azuenilda Trindade, coordenadora de comunicação, há muitas manifestações de preconceito que precisam ser corrigidas. Ela questionou, por exemplo, o calendário escolar baseado exclusivamente nas datas dos santos católicos; o drama de algumas escolas públicas ditas laicas, que propõe currículo escolar com citação de apenas três tradições religiosas e um culto ecumênico realizado numa escola pública em comemoração aos seus 100 anos, na qual só participaram duas religiões.
Além disso, o samba carioca também foi mencionado como uma manifestação sutilmente desconsiderada, quando não desrespeitada, no meio musical, devida a constante presença da cultura afro.
Ao final, Ivanir dos Santos, presidente da comissão, adiantou que está previsto mais um ato na luta contra intolerância religiosa. “Estamos conversando com algumas escolas de samba do Rio de Janeiro – cujos samba-enredos utilizarão a cultura afro - para que haja um apelo público em adesão a diversidade religiosa no dia da apresentação do desfile. Os últimos carros alegóricos com faixas escritas: Liberdade Religiosa. Eu tenho fé".
por Vanessa Campanario
Foto de Alba Valéria
Postado em nosso Blog com a devida autorização da jornalista Vanessa Campanario.
Extraído do site:
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